16 de fev. de 2013

da simpatia ao asco, em 3 minutos.

como já é costume na minha vida, deixei pra comprar os materiais escolares da luana na última hora. não era a única, visto que a papelaria estava cheia de pais com listinhas, irritado com os filhos, que queriam levar apenas aqueles cadernos de 30$.
deixei a luana escolher os cadernos primeiro, eu já tinha visto e sabia que ela iria querer: são do carrossel, atual obsessão. depois fomos ao balcão pra pegar as coisas não tão excitantes, tipo papel crepom e bastão de cola quente.

naquele vai-e-vem, "luana que acha desse lápis, pode ser?", "lulu, vamos levar esse livrinho?", a balconista - quem eu conhecia de vista, pois é essa papelaria que mais vou pra tirar os xerox da faculdade - me pergunta se aquela menininha de 9 anos é minha irmã.
wait, what? disse que não, é minha filha, e ganho aquele olhar de surpresa mas-tão-nova-e-uma-filha-já-moça que eu nem espero a pessoa dizer nada e já emendo "é, eu comecei cedo". risos, ela concorda. fim.
preciso dizer que é raro acharem que a luana é minha irmã. geralmente acham que é sobrinha, ou parente, até verem ela me chamar de mãe. e ainda assim, de vez em quando, rola o "nossa, é sua filha???"
a moça da papelaria arregalou ainda mais os olhos quando a luana lhe contou que eu estava grávida. sério, eu não tenho cara de tão novinha assim. pode ser que o moleton da universidade me ~rejuvenesça, mas não ao ponto de achar que eu nem cheguei aos 20 anos.

bom, enfim, já estava corada de orgulho da minha aparência ~jovial, e estava até disposta a comprar produtos um pouco mais caros e dar uma comissão legal pra essa vendedora tão simpática, tão atenciosa, tão... daí chegou a hora de escolher a cola.

sabe aquele momento em que tudo é magia, você fazendo as coisa sorrindo, em slow-motion, com uma trilha sonora escolhida a dedo, mesmo que você esteja numa papelaria comprando materiais escolares num dia de chuva. sabe, aquela coisa que só os filmes sabem fazer, e você linda, solta, saltitante, oh como a vida é linda. e então tudo acaba com uma fala, uma pessoa, num instante. tem até aquele efeitinho do disco de vinil sendo riscado pela agulha do toca-discos.

ela foi me mostrar marcas de colas escolares, e além das tradicionais, havia uma obscura. a mais barata. eu perguntei se a cola era boa, pelo menos. ela disse que não, que se fosse boa, não teria um índio estampado na embalagem. eu fiquei olhando pra ela, sem conseguir esboçar uma reação. e continou, foi-se o tempo que eles ficavam no meio do mato, quietinhos, sem mexer com a gente... agora tão aí.
ah, meu disquinho sendo riscado e novamente ouvindo o som da chuva.


eu não sou lá grande ativista da causa indígena, até porque não me envolvo, não conheço muito. mas também não é preciso conhecer muito pra se respeitar, pra entender o quanto a cultura deles é diferente da nossa. que as terras que eles querem não é pelo mesmo motivo que os sem-terra querem, nem pra fazer o que os fazendeiros fazem. eles querem terra pra manter viva suas crenças. as quais foram dizimadas por nós.
aqui na região (oeste do paraná), a situação tem estado muito tensa pois andou havendo invasões indígenas em propriedades rurais. a imprensa publica reportagens tão absurdas que eu só posso ler e cair na gargalhada.
eu gargalhava, até ouvir isso da balconistas. há pessoas que leem essas reportagens, baseiam suas opiniões nelas, conversam com os vizinhos enquanto tomam tereré na varanda. e um vai passando pro outro, até a coisa ficar fora do controle.
eu fui criada numa nova cultura de "integração", de valorizar e respeitar as diferenças, que preconceito racial é uma coisa feia e, hoje, crime. mas parece que isso não cabe quando o assunto é índio.

espero que o dia da consciência negra não vire apenas um motivo pras crianças pintarem desenhos de negros na escola.
assim como ocorre com o dia do índio hoje em dia.

Comments (4)

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ca. ra. lho.
1 reply · active 634 weeks ago
"la foi me mostrar marcas de colas escolares, e além das tradicionais, havia uma obscura. a mais barata. eu perguntei se a cola era boa, pelo menos. ela disse que não, que se fosse boa, não teria um índio estampado na embalagem." QUE?

Pera... Deixa eu ler de novo... Eu entendi errado.. nao pode ser...

Nao... eh isso mesmo? Que?

"há pessoas que leem essas reportagens, baseiam suas opiniões nelas, conversam com os vizinhos enquanto tomam tereré na varanda. e um vai passando pro outro, até a coisa ficar fora do controle." sim, sim! E dai povo acha que muçulmano eh tudo homem bomba... E índio não presta... E negro eh bandido...

"
espero que o dia da consciência negra não vire apenas um motivo pras crianças pintarem desenhos de negros na escola." honestamente? Eu acho que ja eh assim...
1 reply · active 633 weeks ago
a sad, sad world...

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